Quando pensamos em educação, a imagem que geralmente vem à mente é a de salas de aula, livros e professores. No entanto, um componente fundamental para o aprendizado e o bem-estar dos estudantes acontece fora desse cenário: na cozinha da escola. A alimentação escolar é mais do que uma simples refeição; é um pilar para o desenvolvimento, a concentração e até mesmo a permanência do aluno na escola.
Em um país de dimensões continentais como o Brasil, garantir uma merenda de qualidade e que agrade aos estudantes é um desafio gigantesco. Pesquisas em diversas regiões apontam que a aceitação dos cardápios nem sempre é alta, com muitos jovens deixando de consumir a refeição por não gostarem da comida ou por preferirem lanches industrializados.
Contudo, um estado parece ter encontrado a receita do sucesso, literalmente. Minas Gerais, famoso por sua culinária rica e afetuosa, está transformando a realidade da merenda escolar, colocando o gosto do aluno como ingrediente principal. Uma pesquisa recente da Secretaria de Estado de Educação (SEE/MG) revelou não apenas o que os estudantes mais gostam de comer, mas também o sucesso de uma política que une nutrição, cultura e carinho.
O desafio nacional da merenda escolar
Antes de mergulharmos no caso mineiro, é importante entender o contexto nacional. A merenda escolar é, para milhões de crianças e adolescentes, a refeição mais importante do dia. Um estudo no Rio de Janeiro mostrou que, para 56% dos alunos, a comida servida na escola é a principal fonte de nutrição diária.
Apesar de sua importância vital, a aceitação nem sempre é garantida. Um levantamento em Corumbá (MS) mostrou que quase um terço dos alunos não consumia a merenda, sendo o principal motivo o fato de "não gostar da comida". Essa rejeição abre espaço para o consumo de salgados e lanches ultraprocessados, vendidos no entorno das escolas, o que vai na contramão dos esforços por uma alimentação mais saudável.
O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) estabelece diretrizes claras: a comida deve ser nutritiva, saudável e, sempre que possível, respeitar a cultura alimentar local. Além disso, a legislação prevê um índice mínimo de aceitabilidade de 85% para os pratos servidos. Atingir essa meta é o grande desafio que gestores de todo o país enfrentam diariamente.
Minas Gerais e o "temperinho de casa" na escola
Enquanto o cenário nacional apresenta desafios, Minas Gerais se destaca por ouvir seus estudantes. Em outubro de 2023, a SEE/MG foi a campo para descobrir: afinal, qual é a merenda preferida da rede estadual? A pesquisa, que envolveu 545 escolas em todas as regiões do estado, trouxe resultados que aquecem o coração e dão água na boca.
O prato campeão, que conquistou o paladar dos jovens mineiros, foi o estrogonofe de frango, servido com arroz e batata. Em um toque de "mineiridade", muitas escolas adicionam feijão ao prato, aumentando seu valor nutritivo e a conexão com a culinária local.
Mas a viagem pelos sabores de Minas não parou por aí. O pódio das preferências foi completado por dois gigantes da cozinha mineira: a feijoada, um clássico ficou em segundo lugar e, na terceira posição, o tradicional feijão tropeiro, um prato robusto, cheio de história e sabor, que reflete a identidade cultural do estado.
Por trás do sabor, uma estratégia de sucesso
O sucesso da merenda em Minas Gerais não é um acaso. Ele é fruto de uma estratégia bem definida que combina investimento, planejamento e valorização. Entre 2019 e 2023, o Governo de Minas Gerais aumentou o investimento em alimentação escolar em mais de 200%, alcançando a marca de R$ 1,4 bilhão. Esse aporte financeiro permite que mais de 35 milhões de refeições sejam servidas todos os meses com qualidade.
A rede estadual não se limita a poucos pratos. Uma cartilha elaborada por nutricionistas oferece 98 opções de refeições, incluindo almoços completos, lanches e frutas. Essa variedade permite que as escolas adaptem os cardápios à sua realidade e aos gostos locais, sempre com o aval de especialistas. Reconhecendo que o carinho é o melhor tempero, o estado criou o "Mestres da Merenda", um programa de TV que funciona como uma competição culinária entre as Auxiliares de Serviços da Educação Básica (ASBs). A iniciativa joga luz sobre o trabalho essencial dessas profissionais, que transformam ingredientes em afeto e nutrição.
A conexão com a agricultura familiar é outra marca. Parte significativa dos alimentos utilizados vem diretamente de produtores locais, através de uma parceria com a Emater-MG. Isso garante ingredientes mais frescos e saudáveis, fortalece a economia local e conecta os alunos com a origem dos alimentos que consomem.
A lição de Minas: ouvir, valorizar e servir
A experiência de Minas Gerais oferece uma lição valiosa para todo o Brasil: a chave para uma merenda escolar de sucesso é ouvir o aluno. Ao colocar as preferências dos estudantes no centro da estratégia, sem abrir mão da qualidade nutricional, o estado conseguiu transformar a hora da merenda em um momento de prazer, aprendizado e pertencimento.
O estrogonofe, a feijoada e o tropeiro servidos nas escolas mineiras são mais do que simples pratos. Eles representam o respeito pela identidade cultural, a valorização do trabalho de quem cozinha com afeto e a certeza de que um aluno bem alimentado e feliz aprende muito mais. É a prova de que, com os ingredientes certos, a educação pode, sim, ter o delicioso sabor de comida de casa.